domingo, 18 de maio de 2014

Alex Polari: Versos e Tortura

             
Descrição para cegos: Alex Polari em uma paisagem com árvores sem folhas.
Foto: Bruno Torturra para a Revista Trip

 Alex Polari de Alverga é paraibano natural de João Pessoa e participou de ações contra a ditadura militar. Ingressou na organização clandestina Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), que foi responsável pelo sequestro do embaixador alemão Ehrenfried Von Holleben. Alex foi preso e torturado pelos militares, entre os anos de 1971 e 1980. Quando preso, ele escreveu poemas que relatavam e expressavam sua experiência como presidiário. Seu livro de poemas Inventários de Cicatrizes foi publicado em 1978. Com palavras fortes, Alex expressa a forma cruel como militares da época tratavam os prisioneiros. Nos poemas abaixo, podemos ver que existia diferença entre os policiais. Havia aqueles que torturavam fisicamente e os que torturavam psicologicamente. Os poemas foram retirados do livro Inventário de cicatrizes. (Polyanna Gomes)


Trilogia Macabra (I - O Torturador)
O torturador
Difere dos outros
Por uma patologia singular
ser imprevisível
vai da infantilidade total
à frieza absoluta.
Como vivem recebendo
Elogios e medalhas
Como vivem subindo de posto,
Pouco importam pelos outros.
Obter confissões é uma arte
O que vale são os altos propósitos
O fim se justifica,
Mesmo pelos meios mais impróprios.
Além de tudo o torturador,
Agente impessoal que cumpre ordens superiores
No cumprimento de suas funções inferiores,
Não está impedido de ser um pai extremoso
De ter certos rasgos
E em alguns momentos ser até generoso.
Além disso acredita que é macho, nacionalista,
Que a tortura e a violência
São recursos necessários
Para a preservação de certos valores
E se no fundo ele é mercenário
Sabe disfarçar bem isso
Quando ladra.
Não se suja de sangue
Não macera nem marca,
(a não ser em casos excepcionais)
o corpo de suas vítimas,
trabalha em ambientes assépticos
com distanciamento crítico
- não é um açougueiro, é um técnico -
sendo fácil racionalizar
que apenas põe a serviço da pátria
da civilização e da família
uma sofisticada tecnologia da dor
que teria de qualquer maneira
de ser utilizada contra alguém
para o bem de todos.
Trilogia Macabra (II - O Analista de Informações)
Eles se acham muito humanos
Quando param de rodar a manivela
Começam a fazer só perguntas
E agindo assim nos nivelam
À categoria e aos direitos
Dos demais seres humanos.
O analista é geralmente um senhor muito fino
Que vela pelo seu prestígio
Que fuma cigarros cem milímetros
Que se veste à paisana
Que usa belas gravatas coloridas
Parecendo mais um executivo bem sucedido
Do que um assassino.

Eles não torturam pessoalmente
Apenas dirigem os interrogatórios
E têm muito orgulho disso
não são o céu nem o inferno,
são o purgatório.

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