Descrição para cegos: da esquerda para a direita a imagem mostra os professores Rodrigo Freire, Monique Cittadino e Nazaré Zenaide atrás da mesa durante o debate. |
Por Marcella Machado
A
justiça de transição chegou de forma tardia no Brasil em comparação aos demais países
da América Latina. A constatação foi feita pelos membros da Comissão Municipal
da Verdade de João Pessoa (CMV). O grupo participou do evento CCHLA
Conhecimento em Debate, no último dia 15, na Universidade Federal da Paraíba
(UFPB).
No
debate, intitulado Ditadura Militar e
Violações dos Direitos Humanos: A Justiça de Transição Brasileira e a
Experiência da Comissão Municipal da Verdade de João Pessoa, os membros da
comissão formada por docentes da UFPB discutiram o modelo de transição adotado
pelo Brasil, as dificuldades de acesso a documentos oficiais e o posicionamento
de políticos paraibanos durante o regime militar (1964-1985).
A
professora do Departamento de Serviço Social, Nazaré Zenaide, ressaltou a
importância da construção de uma memória de resistência e apontou os aparatos
jurídicos utilizados pelos presos e parentes dos desaparecidos políticos para
assistência e proteção de direitos.
Segundo
a docente, as primeiras iniciativas surgiram ainda nos anos 70. “Grupos como o
Tortura Nunca Mais, como o Clamor dentro da Igreja Católica paulista, os
familiares de mortos e desaparecidos da América Latina, todos prestaram
assessoria jurídica e política. Depois da Anistia houve uma pressão
internacional nesse sentido. Na década de 90 surgiram os comitês e em seguida o
apoio do poder público”, destacou Nazaré Zenaide.
Em
funcionamento desde abril de 2014, a Comissão Municipal da Verdade de João
Pessoa prepara seu relatório final com divulgação prevista para este ano. Para
o professor do Departamento de Ciências Sociais, Rodrigo Freire, o acesso à
documentação do período do regime repressivo é uma das maiores dificuldades
para o trabalho das comissões, principalmente nas instâncias militares.
O
professor revelou o cenário de negação e acobertamento que se mantém até hoje. “Nós
não avançamos em nada, como na reconciliação, que é outra dimensão da justiça
de transição. Pelo contrário, os militares ainda estão atuando contra. A
Comissão Nacional da Verdade foi boicotada por eles; isso apesar de vivermos em
uma democracia. Em determinado momento, apareceu um decreto do comandante de um
exército dizendo que nenhuma unidade militar do país deveria receber nenhuma
comissão, contrariando a própria lei”, disse Rodrigo Freire
Na
capital, o acervo documental mais bem organizado foi encontrado na Câmara
Municipal de Vereadores. Através dos arquivos, os pesquisadores identificaram a
forma de atuação dos políticos da época. A subserviência dos gestores aos
poderes dos militares do regime e ausência de autonomia foram as marcas dos
mandatos desses políticos. “Os vereadores recorriam aos militares, sobretudo ao
comando do 15 RI e à Guarnição Federal para investigar ações do Executivo ”,
relatou a professora do Departamento de História, Monique Cittadino.
O
termo justiça de transição se refere ao conjunto de abordagens, mecanismos e
estratégias para enfrentar o legado de violações dos direitos humanos. Entre as
suas finalidades estão atribuir responsabilidades, exigir o direito à memória e
à verdade, fortalecer as instituições com valores democráticos e garantir a não
repetição de crimes como a tortura.
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