Descrição para cegos: a imagem mostra um desenho com o busto de Elizabeth Teixeira respingado com vinho. Por cima do papel está uma taça de vinho caída. |
Por Gabriela
Güllich
“Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta”
A música de Chico Buarque e Gilberto Gil sintetiza uma súplica por algo que se deseja ver à distância. Esse pedido serve tanto para o “cálice” de vinho tinto de sangue das vítimas de tortura, quanto para o “cale-se” imposto pela repressão. Seguindo a metáfora da música, a matéria apresenta uma série de ilustrações feitas em nanquim e vinho tinto. Baseada no material Compartilhando Memórias, cada ilustração traz consigo o relato de uma vivência sob a ditadura.
“Vão tirar a minha vida. Você continua a minha luta?”
Era a frase que João Pedro dizia
todas as noites para Elizabeth. “Eu nunca tive voz pra dizer que continuava”,
lembra. Seu marido, João Pedro Teixeira, foi assassinado pelo chamado “Grupo da
Várzea”, em uma emboscada quando voltava de João Pessoa para casa. Marcados por
forte militância junto às Ligas Camponesas, Elizabeth então continuou a luta e,
por consequência disso, foi presa várias vezes.
"(...) A luta não para.
Enquanto houver a fome e a miséria atingindo a classe trabalhadora, tem que
haver luta dos camponeses, dos operários, das mulheres, dos estudantes e de
todos aqueles que são oprimidos e explorados." – Elizabeth Teixeira
Descrição para cegos: a imagem mostra a imagem de um homem sentado (aprisionado). Seu corpo está pintado de vinho e a parede está riscada por traços que indicam a contagem de dias sem comer. |
“Torturavam
os presos em uma salinha vizinha às nossas celas... Eu acho que era de
propósito. Um cara algemado e cinco, seis guardas cada um com um chicote de
cavalo batendo no cara”
José
Adeildo Ramos era marinheiro. Expulso da Marinha, teve de responder pelo
processo de aliciamento à indisciplina e então foi preso. Na prisão, foi um dos
responsáveis por sucessivas greves de fome. Eram doze, vinte dias sem comer.
“Os primeiros dias são os mais difíceis, depois a gente ia definhando. Todo dia
perdia meio quilo”, relata.
Perseguidos
pela repressão, Simão Almeida e Ana Rita foram para Goiás. Conseguiram, com apoio da militância, tirar
nova documentação, mudando totalmente a identidade. Simão virou Francisco e Ana
Rita agora era Ana Maria.
Com essa nova identidade, Simão prestou concurso
público para coletor estadual, foi aprovado e logo nomeado para atuar em uma
pequena cidade. Esse cargo de coletor estadual corresponde a uma espécie de
representação da secretaria de finanças em cada município, cabendo ao coletor
fiscalizar a arrecadação de todos os tributos. Ou seja, é uma das autoridades
do município. Ana Rita, por ter formação superior, logo tornou-se professora
respeitada na cidade.
Eles
viveram lá até que foi assinada a anistia. Do dia para a noite, sumiram da
cidade e voltaram para a Paraíba, deixando a população perplexa, sem entender o
sumiço, principalmente porque todos os tributos arrecadados foram deixados
intactos e toda a escrituração absolutamente atualizada.
Descrição para cegos: a imagem mostra o desenho de um rapaz pichando um muro. A frase pichada diz "O Castelo é Branco mas a fome é negra". |
“O Castelo
é Branco mas a fome é negra”
Flávio Tavares não fez parte do grupo que sofreu na pele o
momento mais
crítico da repressão. Mesmo assim, tem um histórico de resistência. Ele unia a habilidade artística junto à ação estudantil. Quando adolescente, foi preso por pichar o muro de um coronel.
crítico da repressão. Mesmo assim, tem um histórico de resistência. Ele unia a habilidade artística junto à ação estudantil. Quando adolescente, foi preso por pichar o muro de um coronel.
Descrição para cegos: a imagem mostra uma mão segurando documentos manchados de vinho. Ao fundo está uma igreja grande e com aspecto antigo: o Mosteiro de São Bento. |
De posse de documentos importantes e com medo de que fossem
perdidos, Fernando Moura enterrava os papéis no jardim do Mosteiro de São
Bento.
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