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Descrição para cegos: a imagem mostra um desenho do rosto de Wolinski. |
por Carmélio Reynaldo
No início dos anos 70, sob censura,
catando nas livrarias e bancas de revista, era possível encontrar algo para ler
que proporcionasse satisfação a quem não se conformava com o discurso de
exaltação à ditadura. É o caso da revista O
Grilo, na qual conheci o trabalho de Wolinski.
De suas histórias, uma me persegue
todos esses anos. A morte de Wolinski, ontem, num ataque terrorista à revista Charlie Hebdo, onde trabalhava, terminou
a construção dessa sombra que vai me cobrar mais indignação diante da violência
como política.
A história a que me refiro contava
o sequestro de um cidadão comum por um grupo armado em conflito com um Estado.
O grupo, diante da apatia da opinião pública, radicaliza raptando uma pessoa
escolhida a esmo, pretendendo, assim, mostrar à sociedade que qualquer um pode
ser atingido pelo conflito, pelas questões políticas, mesmo quando tenta se
manter à margem, indiferente.
De certa forma, tenho visto
concretizar-se aquela história em seguidas ações de grupos armados em atuação
no mundo, usando o sequestro e o assassinato de pessoas comuns como instrumento
de pressão política. Ao contrário dos personagens de Wolinski, por falta de proximidade,
de identificação, de empatia com as vítimas, acompanho essas notícias com certa
indiferença.
Ontem, quando ouvi no rádio a
notícia do atentado aos profissionais do Charlie
Hebdo, minha reação foi mais pelo significado do ataque à imprensa do que
pelas pessoas mortas – até então, apenas um número. Depois, quando fiquei
sabendo que entre os mortos estava Wolinski, me comovi de verdade: agora uma
das vítimas tem traços e histórias que fazem parte da minha vida. Veio-me,
então, a percepção de que, ao contrário do que o mestre defendia, a minha
reação à violência ainda depende de alguma empatia com a vítima.
Peço perdão ao grande Wolinski por
isso. Que descanse em paz.
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